1. INTRODUÇÃO

Desde 1997, com o Decreto 2.271, o Governo federal vem intensificando suas contratações de serviços terceirizados. As despesas com terceirização vêm crescendo anualmente, em especial a partir de 2003 (SAIGG, 2008). A locação de mão-de-obra quase dobrou de representatividade no custeio federal, de 2009 a 2013 (CGU, 2015). Consulta ao Painel de Custeio (paineldecusteio.planejamento.gov.br) demonstra que, de 2016 a 2020, foram gastos R$ 84 bilhões em itens de despesa associados, de modo geral, à terceirização[1], o que representa 54% de todo o custeio administrativo ali evidenciado. Dados disponibilizados pela CGU[2] informam que em janeiro de 2019, estavam atuando, pelo menos, 98 mil empregados terceirizados em órgãos do Poder Executivo federal.

A terceirização, portanto, tomando esses números como referência, tem se tornado um elemento extremamente relevante na estrutura administrativa do serviço público, em vários aspectos. E um desses aspectos é certamente a gestão contratual.

Em 2019, os órgãos federais mantinham cerca de 8.000 contratos envolvendo serviços com dedicação exclusiva de mão de obra, somando R$ 8,5 bilhões de gastos anuais[3].

Para cada um desses contratos, foram despendidos esforços administrativos de planejamento, seleção do fornecedor, assinatura, monitoramento, fiscalização, revisão, pagamento. E cada etapa nessa cadeia de esforços tem custos de transação, pode representar riscos e exigir controles para sua mitigação. 

A adequada gestão de riscos em contratações é uma premissa da boa governança em compras públicas. Gerenciar os riscos por meio de controles internos adequados, oferece maior segurança de que os resultados serão atingidos, se traduzindo em maior eficácia da atuação governamental, redução de incertezas e ampliação da chance de combater desperdícios, seja de esforços, recursos, dinheiro ou tempo. E menos desperdício se traduz em mais entregas para a sociedade (SOUZA e SANTOS, 2019).

Visando a contribuir para a reflexão sobre mapeamento, avaliação e tratamento de riscos, assim como a análise de custo e benefício de controles nos contratos de serviços terceirizados, de natureza continuada, especialmente aqueles com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, apresentamos estatísticas de execução contratual no Poder Executivo federal.

2. METODOLOGIA

Os dados se referem aos contratos dos órgãos federais, integrantes do Sistema de Serviços Gerais (Sisg), cujos registros constam do Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais (Siasg), de alimentação compulsória por unidades Sisg. A extração foi realizada pela plataforma de consulta gerencial, DW Comprasnet. Extraíram-se contratos assinados de 2015 a 2020 (nesse último ano, até outubro), licitados por pregão eletrônico, categorizados como “serviço”, contendo palavras-chave (vide Anexo), no campo “descrição de objeto do contrato”, que pudessem filtrar os tipos mais comuns de funções terceirizadas: apoio administrativo, vigilância, limpeza, manutenção predial e manutenção de elevador ou ar-condicionado. Os quatro primeiros segmentos são executados com dedicação exclusiva de mão de obra e foram filtrados para que representassem apenas esse tipo de contrato. A manutenção de elevador ou ar-condicionado foi filtrada para representar, majoritariamente, contratos sem mão de obra exclusiva. O objetivo de incluí-los foi comparar segmentos com e sem dedicação exclusiva dos empregados terceirizados.  

Tratamos os resultados, excluindo registros com valores iniciais inferiores a R$ 50 mil (exceto em manutenção de elevadores ou ar-condicionado) e eliminando duplicidades, contratos de natureza não continuada, objetos contratuais que se referiam a “aquisição” ou “fornecimento”, assim como descrições incompatíveis com a seleção pretendida (vide Anexo). Infelizmente, não há um indicador no Comprasnet para contratos com dedicação exclusiva de mão de obra. Daí a necessidade do esforço manual de filtragem.

Utilizamos, ainda, cruzamento de dados e novas extrações, com o objetivo de obter, para cada empresa contratada, a quantidade de advertências e multas registradas no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf), bem como a quantidade de penalidades restritivas: suspensão, impedimento e inidoneidade. Foram obtidas, também, as médias de quantidade de licitantes e lances ofertados em cada pregão que deu origem aos contratos.

Ao final, obtivemos planilhas com mais de 10 mil contratos, totalizando R$ 21 bilhões, considerados seus valores finais, incluídas prorrogações. Todos em regime de dedicação exclusiva, exceto os de manutenção de elevador ou ar-condicionado. Essas contratações envolveram quase 2.600 unidades compradoras diferentes (Uasg). Agrupamos os contratos em 5 segmentos, conforme seu objeto principal (vide Anexo).

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3. ESTATÍSTICAS DOS CONTRATOS TERCEIRIZADOS FEDERAIS

Com os dados disponíveis, aplicamos diversos filtros e consultas gerenciais, buscando evidenciar estatísticas que possam ser úteis em estudos, análises e tomadas de decisão sobre contratações de serviços de natureza continuada, especialmente aqueles que envolvem dedicação exclusiva dos empregados terceirizados.

Esperamos que as estatísticas aqui apresentadas possam ser úteis em estudos preliminares e termos de referência de contratações de serviços terceirizados, especialmente em termos de escolhas de modelagens, critérios de seleção e métodos de fiscalização contratual.

Torcemos, também, para que revisões normativas possam se valer dessa realidade para avaliar impactos, custos e benefícios de mecanismos de controle, levando em conta a premissa há mais de 50 anos estabelecida pelo artigo 14 do Decreto-Lei n. 200/1967, de controlar de modo proporcional aos riscos.

3.1 Taxas de rescisão

Rescisões contratuais são um bom indicador de riscos que se materializam durante a execução do serviço. Sabemos que nem toda rescisão ocorre por falha do contratado, pois há o caso previsto no art. 79, II, da Lei n. 8666/93, em que o fim do contrato é amigável, por acordo entre as partes. Há, também, alguns dispositivos do art. 78 da mesma lei, nos quais o motivo da rescisão pode se originar de comportamento do contratante, como, por exemplo, razões de interesse público, suspensão por ordem da Administração por mais de 120 dias ou o atraso nos pagamentos superior a 90 dias.

Entretanto, há vários motivos de rescisão provocados por comportamento inadequado do contratado, como o não cumprimento ou irregularidade no cumprimento de cláusulas contratuais, especificações, projetos ou prazos, lentidão, atraso injustificado, paralisação sem justa causa ou o cometimento reiterado de faltas.  

Em contratos com dedicação exclusiva de mão de obra, as regras prescrevem que o descumprimento das obrigações trabalhistas ou a não manutenção das condições de habilitação pelo contratado podem resultar em rescisão contratual (item 8, Anexo VIII-B, IN 05/2017).

Para reforçar essa ideia geral, investigamos os motivos das rescisões registradas. Adotamos amostra aleatória de 500 contratos rescindidos (61% do total), da qual coletamos o CNPJ do contratado e o número do contrato, buscando, com esses dados, extrato de rescisão publicado no Diário Oficial da União. Das 500 tentativas de busca, 179 foram bem sucedidas (22% do total de rescisões registradas nos dados coletados). As demais foram frustradas por ausência de resultado ou por publicação genérica, sem informação suficiente.

Das 179 ocorrências obtidas, 31% se referem a rescisões amigáveis e 62% a falhas do contratado, sendo 7% de outros motivos. Fica claro que a maioria das rescisões são motivadas por problemas na execução, representando riscos para o contratante.

Assim, conhecer as taxas de rescisão pode ajudar a dar uma ideia da probabilidade do risco de inadimplência trabalhista ou previdenciária, tendo em vista a notória associação entre esse problema e a terceirização que envolve mão de obra em dedicação exclusiva. Estudo de Freitas (2011) apontou que o problema de execução contratual mais recorrente em serviços terceirizados é o de atrasos em pagamentos de salários, férias e benefícios trabalhistas aos empregados vinculados a cada contrato.

É fundamental ressaltar que o risco de inadimplência trabalhista foi o principal motivador do Acórdão n. 1214/2013, do Plenário do Tribunal de Contas da União (TCU), que recomendou a introdução de diversas medidas de controle, entre elas, em especial, critérios mais rigorosos de habilitação na etapa de seleção do fornecedor, tais como patamar mínimo de Capital Circulante Líquido, Patrimônio Líquido proporcional aos compromissos já assumidos e 3 anos de experiência no ramo licitado.

Esse famoso julgado, dessa forma, induziu significativas alterações nas regras de contratação de serviços continuados de terceirização, formalizadas na IN SLTI nº 6/2013, em dezembro daquele ano, de tal forma que as unidades federais integrantes do Sisg passaram a exigir, em seus editais, com base em modelos elaborados pela Advocacia Geral da União, novos critérios e parâmetros de controle para reduzir os riscos de contratar empresas incapazes de cumprir suas obrigações, principalmente aquelas relacionadas com pagamento de salários, benefícios e encargos dos trabalhadores vinculados à execução dos serviços.

Nesse contexto, as taxas de rescisão de contratos federais assinados a partir de 2015, representam, também, possíveis efeitos desses controles mais rigorosos na habilitação de licitantes.

Buscando avaliar potenciais diferenças nos riscos de rescisão com base em aspectos dos fornecedores, compilamos os dados conforme o porte do contratado.

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Esses números indicam que os contratos sem dedicação exclusiva, de manutenção de ar-condicionado ou elevador, apresentam riscos menores. Uma explicação é que, por não envolverem a alocação exclusiva de empregados, há menor probabilidade de problemas relacionados com direitos trabalhistas e previdenciários. As causas de rescisão, nesse caso, podem estar mais relacionadas com o desempenho do contratado na entrega do serviço.

Além disso, as atividades de manutenção são mais especializadas, ofertadas por fornecedores de ramos comerciais mais focados, o que pode ajudar a explicar os riscos menores. É o que se observa, também, na manutenção predial, que teve taxas de rescisão abaixo do patamar dos demais serviços com dedicação exclusiva.

Em contraposição, as maiores taxas de rescisão estão no segmento dos serviços genéricos de apoio administrativo, que englobam as atividades de copeiragem, portaria, recepção, secretariado, carregadores, brigadistas, motoristas, chamados pelo TCU de “serviços não especializados”, fornecidos por empresas voltadas, em geral, à mera disponibilidade de postos de trabalho aos contratantes, sendo especializadas apenas em gestão de mão de obra.

Nota-se uma tendência do aumento de risco conforme diminui o grau de especialização técnica do mercado fornecedor. Em razão disso, para modelagens mais robustas, em termos de desempenho e resultados, em clara quebra de paradigma aos modelos tradicionais, entende-se ser a especialização um caminho possível. São vislumbrados menores riscos quando se contratam, para objetos tecnicamente sofisticados, empresas verdadeiramente especializadas na prestação dos serviços, que entregam planejamento, coordenação e gestão de pessoas, processos e insumos, produzindo resultados mensuráveis e sendo remuneradas pela lógica do lucro-eficiência em vez do lucro-incompetência.

O TCU usa o termo “lucro-incompetência” quando se refere aos contratos de terceirização que vinculam o lucro da contratada à quantidade de empregados disponibilizados, baseados exclusivamente em postos de trabalho. A expressão foi adotado em diversos Acórdãos, como, por exemplo, 786/2006, 1923/2016, 2010/2018, 1262/2020, todos do Plenário. Quanto mais gente, mais lucro. Não há qualquer estímulo para que a empresa busque melhorar a produtividade, pelo contrário, quanto pior o desempenho na execução das tarefas, mais pessoas serão requisitadas e maior será o lucro auferido. Em contraposição, propomos o termo “lucro-eficiência”, para designar contratos que remuneram por desempenho, permitindo que o contratado exerça sua especialização técnica e desenvolva mecanismos modernos, eficientes e inovadores, que aumentem a produtividade.   

Não se pode olvidar, contudo, em linha com os mecanismos de gestão de risco, que as contratações tecnicamente sofisticadas e inovadoras, aqui excluídos os modelos tradicionais de mera terceirização com dedicação exclusiva de mão de obra, devem ser precedidas de avaliação da influência do fator “especialização técnica” na competitividade do certame, ambos estratégicos na obtenção da proposta mais vantajosa.

Admitimos que nem toda rescisão contratual decorre de inadimplência trabalhista, mas, por óbvio, esse é um fator preponderante nas rescisões dos contratos com mão de obra dedicada. Os números levantados, portanto, servem de suporte fundamentado à tomada de decisão sobre riscos e controles nas contratações.

O outro aspecto relevante de análise é a diferença entre fornecedores de Micro e Pequeno porte (MPE) e os demais. De modo geral, parece existir maior propensão às rescisões dos contratos assinados com empresas de menor porte.

Essa análise pode ser complementada com dados adicionais, relativos ao volume financeiro dos contratos e à proporção de pactos conforme o porte da empresa contratada.

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De relevante, podemos evidenciar que, diferente das demais, a área de vigilância tem baixa participação de MPE. Uma possível causa são as regras específicas do mercado, regulado e fiscalizado pela Polícia Federal. Em sentido contrário, a manutenção de elevadores ou ar-condicionado é fortemente dominada pelas micro e pequenas empresas. A possível explicação está no volume financeiro dos contratos.

Observando a Tabela 4, verificamos que quase 70% dos contratos de manutenção de elevadores ou ar-condicionado são assinados por até R$ 100 mil. Esse fator pode ser decisivo para atrair e favorecer mais as MPE, especialmente se consideramos os benefícios disponíveis para essas empresas previstos na Lei Complementar n. 123.

Nos demais segmentos, fica clara a preponderância das MPE na faixa de R$ 100 mil a R$ 1 milhão.

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É bastante evidente que à medida que crescem os valores contratados, aumenta, também, a participação das médias e grandes empresas, reduzindo a proporção de MPE. De modo geral, quase 80% dos contratos até R$ 100 mil são vencidos por Micro e Pequenas. Ao passo que isso acontece em menos de 30% das avenças acima de R$ 1 milhão.

Agora podemos avaliar as taxas de rescisão conforme o volume financeiro e o porte da contratada.

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Extraímos desses números, em conjunto com os da Tabela 4, a conclusão de que, de maneira geral, há mais riscos associados aos contratos mais vultosos e àqueles assinados com Micro e Pequenas empresas. Acima de R$ 1 milhão, considerando todos os segmentos, contratos envolvendo MPE têm 46% a mais de chances de rescisão.

Recortando apenas apoio administrativo e limpeza, as taxas de rescisão com MPE são ainda mais expressivas, comparadas com as de fornecedores de maior porte. Chegam a ter 79% a mais de proporção de ocorrências nos pactos até R$ 100 mil.

A maior taxa de rescisão chega a mais de 16% com MPE em contratos de apoio administrativo acima de R$ 1 milhão. Nesse segmento, as avenças de maior vulto representam 20% do total e as MPE ganham 30% das disputas. Esse é o recorte mais preocupante do conjunto de dados.  

No segmento de vigilância, a tendência se inverte, com mais rescisões, proporcionalmente, em empresas médias e grandes. Já no segmento de manutenção sem dedicação exclusiva de mão de obra (elevador ou ar-condicionado), a proporção de risco das MPE é bem mais evidente, porque entre os fornecedores de maior porte a taxa de rescisão chegou a níveis irrisórios, ao ponto de zerar nos contratos acima de R$ 1 milhão. 

Observando que os riscos aumentam conforme o valor contratual, um elemento que pode contribuir para o cenário é o risco de fraude documental nas licitações, como foi identificado em operações especiais conduzidas pela Controladoria-Geral da União e Polícia Federal, nas Operações Kamikaze, Kamikaze 2 e Matreiro, realizadas entre 2014 e 2016, que revelaram empresas de fachada, com documentação falsa, fraudando pregões eletrônicos de serviços terceirizados em órgãos federais. Há necessidade de focar esforços em melhorar os controles nesse espectro contratual: contratos vultosos, especialmente os vencidos por Micro e Pequenas empresas.

Uma possível causa para os maiores riscos associados às MPE pode estar relacionada com as estruturas menos robustas dessas empresas. Esse fato, importante frisar, não é, em hipótese alguma, suficiente para afastá-las dos certames licitatórios, cujos objetivos devem também passar pela promoção dos pilares econômico e social da sustentabilidade.

O que se espera com esses dados é contribuir para o aperfeiçoamento da gestão pública, tanto em termos de estudos individualizados de cada contratação, quanto em cenários mais amplos, de debate das políticas públicas, seus custos e seus benefícios. Afinal, é diretriz da governança pública o processo decisório orientado pelas evidências, como define o Art. 4º, VIII, do Decreto 9.203/2017.

As informações aqui apresentadas servem para munir os gestores públicos de dados que lhes permitam fortalecer seus controles internos e aprimorar suas respostas a cada um dos riscos, na medida da probabilidade de sua ocorrência.

Nesse sentido, vale conferir se as taxas de rescisão se modificam conforme a longevidade contratual, ou seja, o prazo de vigência total, incluindo prorrogações.

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Extraímos desses números a constatação de que os maiores riscos se concentram nos primeiros 12 meses, sendo reduzidos conforme aumenta a longevidade contratual.

E as ocorrências registradas contra o fornecedor, como advertências, multas, suspensões, impedimentos, será que afetam as chances de rescisão?

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Fica evidente que o risco de rescisão aumenta consideravelmente, à medida que existam mais registros negativos na ficha do fornecedor no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf). Esse é um elemento fundamental de análise de riscos na assinatura e durante a execução do contrato. Controles podem ser ajustados conforme o nível e tipo de ocorrências existentes.

Outro fator que decidimos testar foi a influência do tempo de cadastro do fornecedor no Sicaf nas taxas de rescisão.

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A Tabela 8 demonstra que, de modo geral, em contratos com dedicação exclusiva de mão de obra, empresas com menor tempo de ingresso no Sicaf, até 2 anos, em relação à assinatura do contrato, tendem a apresentar maior risco de rescisão. A inexperiência em licitações e na prestação de serviços ao poder público pode ser uma explicação.

De maneira complementar, na Tabela 9, testamos a proporção entre o capital social do fornecedor e o valor do contrato assinado, como potencial indicador de impacto nos índices de rescisão contratual.

Os dados apontam para maior risco quando o fornecedor assina um contrato cujo valor inicial está mais próximo de seu capital social, em especial nos segmentos de apoio administrativo e limpeza. De modo geral, quanto maior o capital social em relação ao valor contratado, menor a chance de rescisão. Isso reforça a lógica, já expressa na legislação, de que o capital social é um indicador de capacidade econômico-financeira do fornecedor, sendo um instrumento válido de avaliação das condições de habilitação do licitante.

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Esses, portanto, são elementos que podem ser considerados pelos planejadores, supervisores e gestores das contratações, como um farol para situações de maior ou menor potencial de incidentes indesejáveis no curso da prestação do serviço pretendido. A gestão de riscos não é um instrumento estático, pelo contrário. O risco é dinâmico, ativo e se modifica com o tempo (SOUZA e SANTOS, 2019, p. 228). E se o risco é alterado, as respostas aos riscos precisam ser atualizadas, implementando novos controles ou modificando os já existentes. Para isso, ter dados que possam contribuir para a identificação e avaliação dos riscos é fundamental.

3.2 Concentração de valor contratual

Um dado que nos pareceu importante investigar foi a concentração do valor contratual nos maiores fornecedores.

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De modo geral, em cada ano, em cada segmento, 10 fornecedores, não necessariamente os mesmos, concentram grandes porções do valor contratado. Não parece haver um padrão estável, mas é bastante evidente que há tendência para que um grupo extremamente reduzido de licitantes obtenha, anualmente, os contratos mais vultosos, mantendo-se significativa concentração.

Embora as MPE ganhem muitos contratos, em quantidade, predominando na maioria dos segmentos, poucas empresas dominam os grandes valores contratuais.

Isso é mais bem evidenciado quando observamos a quantidade de fornecedores diferentes em cada ano e segmento, conforme a Tabela 11.  

Os contratos analisados envolveram, a cada ano, algo próximo de 1.000 fornecedores diferentes, desconsiderando 2020, que possivelmente sofreu influência dos efeitos da pandemia, até pela quantidade menor de contratações (em média, de 2015 a 2019, foram 1.837 contratos por ano, enquanto 2020 teve 1.198 até o momento da extração).

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Esses números tornam ainda mais contundente a concentração de valores nos 10 maiores vencedores de cada ano e segmento. Se calcularmos as médias do total geral do período, combinando as tabelas 10 e 11, constatamos que cerca de 1% dos fornecedores dominaram em torno de 43% do valor contratado anualmente.

3.3 Duração contratual

Outro fator que investigamos foi a duração dos contratos. Nesse caso, filtramos apenas os pactos assinados em 2015, porque é o único ano, na amostra, a partir do qual poderia ser alcançada a vigência máxima legalmente permitida, de 60 meses.  

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Verificamos que os contratos de natureza continuada têm a tendência de chegar próximo da duração máxima, especialmente quando assinados com empresas de médio e grande porte. Isso pode ajudar a modelar decisões sobre prazos de vigência, tanto iniciais quanto, principalmente, prorrogações, procedimentos que exigem significativos esforços administrativos e representam altos custos de transação na gestão contratual e podem ser mais eficientes se forem observados controles proporcionais ao risco.

Em complemento, utilizando dados de 2015 a 2018, avaliamos o percentual de contratos que não ultrapassaram os primeiros 12 meses de vigência, conforme dados da Tabela 13.

Percebemos que as chances de um contrato não ultrapassar 12 meses é maior quando assinado com MPE. De modo geral, cerca de 30% das avenças é encerrada no primeiro ano de vigência, o que, em contraponto, significa que cerca de 70% dos contratos acabam ultrapassando essa barreira.

É relevante, nesse contexto, chamar atenção para o fato de que não estão claros os motivos que determinam o fim da vigência, sem a prorrogação que seria esperada, considerando a tendência dos demais contratos e o permissivo legal. Há várias causas possíveis para o fenômeno. A prestação do serviço com qualidade insuficiente pode ser uma delas, assim como variações de preços no mercado fornecedor. Mas há também fatores relacionados com o próprio contratante, a exemplo de atrasos de pagamento, fragilidades orçamentárias, alterações administrativas que levam a mudanças de demandas. Tais condicionantes podem fazer com que o fornecedor contratado não aceite a prorrogação ou que ela se torne desvantajosa.

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Acreditamos que um tema de estudo extremamente relevante seria o de aprofundar análises sobre as principais causas que afetam a longevidade contratual, cujos resultados podem contribuir bastante para tomadas de decisão no planejamento de contratações, construção de normas e debates a respeito de políticas do setor.

Ainda sobre duração contratual, verificamos que, como seria de esperar, a esmagadora maioria dos contratos é assinada com vigência inicial de 12 meses. É o que os dados apontam, considerando todo o período de 2015 a 2020.

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Esse cenário é compreensível, tendo em vista a jurisprudência majoritária no sentido de que 12 meses é a regra, exigindo robusta motivação na escolha de prazos superiores.  Percebemos que essa jurisprudência está alinhada aos dados constantes da Tabela 6, que evidenciam maiores indícios de problemas no primeiro ano de vigência contratual, com gradual redução de casos de rescisões nos anos subsequentes.

3.4 Concorrência nas licitações

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Como último aspecto de nossa investigação, compilamos os dados da quantidade de licitantes participantes e lances ofertados nos pregões que deram origem aos contratos analisados.

Os números da Tabela 15 demonstram que o aumento do valor contratual em disputa provoca, como seria de esperar, maior interesse do mercado fornecedor, atraindo mais licitantes e estimulando mais lances.

Essa constatação pode servir de referência para estudos de modelagens de contratação, especialmente por suscitar a ideia de maior chance de competição em licitações de maior vulto, que podem integrar serviços diferentes, associados às demandas de gestão da ocupação, tal como passou a permitir recentemente a Lei n. 14.011/2020.

É importante, entretanto, ponderar que muito provavelmente existe um ponto ótimo, como uma distribuição normal de Gauss. O vulto da contratação, se elevado demais e ultrapassado o ponto de equilíbrio, tenderá a reduzir gradualmente o universo de licitantes, já que exigirá critérios mais rigorosos de qualificação. Quando testamos os dados da amostra para contratos em faixas de valores mais expressivos, verificamos tendência geral de que, até R$ 30 milhões, aumenta a quantidade de licitantes à medida que aumentam os valores envolvidos, reduzindo a concorrência a partir desse ponto. É um cenário que desperta atenção para modelagens que possam restringir em demasia o potencial competitivo, caso ultrapassem patamares compatíveis com o mercado fornecedor disponível.

Também é relevante ressaltar que esses dados podem contribuir para fundamentar decisões sobre controles adotados nos editais dos pregões de contratos de natureza continuada e aqueles com dedicação exclusiva de mão de obra.

Nos recentes Acórdãos-TCU 2.870/2018-Plenário e 7.164/2020-2ª Câmara, da relatoria dos Ministros Walton Alencar Rodrigues e André de Carvalho, respectivamente, defendeu-se que até mesmo alguns critérios de referência estabelecidos no Acórdão 1214/13, a exemplo da experiência de três anos, devem se basear em adequados estudos prévios e na experiência pretérita do órgão contratante, que indiquem que as exigências mais restritivas são indispensáveis para assegurar a prestação do serviço em conformidade com as necessidades específicas do órgão, por força da sua essencialidade, quantitativo, risco, complexidade ou qualquer outra particularidade. Os dados aqui apresentados podem servir de referência para tais estudos.

Servem, certamente, para justificar uma reflexão sobre os controles e parâmetros que adotamos hoje.

4. HÁ O QUE MELHORAR?

4.1 Prazos de vigência

A depender das características do objeto e da materialidade envolvida na contratação, prazos de vigência maiores podem atrair mais concorrência, melhores preços, participação de empresas mais bem qualificadas para prestar o serviço, geração de estabilidade e economia pela amortização de investimentos e curva de aprendizado, incentivando a adoção de novos métodos e tecnologias, relacionamento duradouro, de parceria e confiança, reduzindo incertezas do fornecedor e diminuindo custos processuais com renovações.

Seguindo essa lógica, há jurisprudência do Tribunal de Contas da União permitindo a vigência inicial estendida, com a finalidade de obter preços e condições mais vantajosas para a Administração, como o Acórdão nº 3.320/2013-TCU-2ª Câmara, relator Ministro Raimundo Carreiro, no qual se estabeleceu a relevância de considerar as circunstâncias de forma objetiva, fazendo-se registrar no processo próprio o modo como interferem na decisão e quais suas consequências, demonstrando o benefício decorrente do prazo estabelecido. A AGU, na Orientação Normativa nº 38/2011 também já se posicionou favorável ao prazo superior a 12 meses, de modo excepcional, em função da peculiaridade e/ou complexidade do objeto, desde que demonstrado o benefício. Essa prática já é utilizada inclusive em licitações promovidas pelo próprio TCU, a exemplo do Pregão Eletrônico nº 64/2015, para contratação de limpeza, que estabeleceu 30 meses de vigência inicial.

A vantajosidade de prazo maior na vigência inicial, no caso específico da limpeza, foi evidenciada em iniciativa da Universidade Federal de Santa Catarina, que licitou o serviço com duas possibilidades: 12 ou 30 meses[1]. Dispondo de duas hipóteses de contratação, cada licitante poderia avaliar a melhor proposta a ser ofertada para a execução do objeto. As propostas para 30 meses foram mais vantajosas e, consequentemente, adjudicadas.

Se combinarmos os dados dos Tabelas 6 e 12, sobre as taxas de rescisão mais altas até 12 meses de vigência e longevidade contratual média próxima de 40 meses, podemos formular uma alternativa de ação em casos que não exijam grandes investimentos iniciais: começar com 12 meses e prorrogar por 24. Ultrapassado o período mais crítico da vigência inicial, os riscos diminuem, a relação com o contratado já está mais madura e o controle da prorrogação poderia ser ajustado, reduzindo os custos administrativos, aumentando a segurança para o contratado e estimulando a consolidação de uma relação de confiança entre as partes. A fundamentação jurídica para prorrogar com prazo diferente do original já existe, por meio da Orientação Normativa AGU n. 38/2011, c, segundo a qual “é juridicamente possível a prorrogação do contrato por prazo diverso do contratado originariamente”.

4.2 Conta Vinculada e gestão de riscos

Mais alternativas de ação podem e merecem ser suscitadas a partir da análise dos dados que apresentamos. A discussão que propomos é de natureza similar àquela que deu origem ao Acórdão 1214/13: riscos e controles, custos e benefícios, avaliação de práticas atuais e proposição de mudanças potenciais.

Em especial, gostaríamos de promover um debate racional sobre a conta vinculada (CV), procedimento de controle previsto pelas normas federais para mitigar riscos de inadimplência em caso de custos de mão de obra provisionados, buscando

evitar a responsabilização subsidiária. Na conta vinculada são depositados recursos para cobrir custos potenciais com décimo terceiro salário, férias e encargos previdenciários e FGTS incidentes sobre as rescisões de trabalho sem justa causa.

O começo da conta vinculada remonta a 2009, quando o próprio TCU, por meio do Acórdão n° 1.937/2009 –2ª Câmara, relator Ministro Benjamin Zymler, determinou ao Banco do Brasil que implantasse um “fundo de reserva” para fazer frente a encargos trabalhistas e previdenciários em seus contratos terceirizados e, com isso, afastar possível responsabilidade solidária por eventual inadimplemento daqueles encargos. Naquele mesmo ano, o Banco recorreu e o Tribunal, no Acórdão n° 4.720/2009- 2ª Câmara, relator Ministro Aroldo Cedraz, reconheceu que a conta vinculada não tem amparo legal, aumenta o preço do serviço, cria controles adicionais que aumentam o custo administrativo e podem, até mesmo, reforçar a responsabilidade subsidiária.

Mesmo assim, ainda naquele ano de 2009, a CV acabou introduzida, como opção, na IN SLTI nº 02/2008.

Quatro anos depois, no Acórdão 1214/13, a CV foi novamente avaliada pelo TCU, que consolidou sua visão negativa sobre o controle, entendendo representar interferência direta na gestão da contratada e não ser compatível com a ideia de gestão contratual menos onerosa possível ao erário.

A AGU, entretanto, pouco depois, no Parecer nº 73/2013 DECOR/CGU, entendeu pela legalidade da conta vinculada e recomendou sua adoção em todo e qualquer contrato de serviço terceirizado, citando, inclusive, como fundamento, o Acórdão 1214/13.

Diante disso, instalou-se contradição de entendimentos: o TCU, majoritariamente contrário à conta vinculada, e a AGU, baseada no mesmo acórdão, recomendando adoção obrigatória. 

A discussão sobre esses controles precisa levar em conta, como toda análise de gestão de riscos, probabilidades, impactos, custos e benefícios. Foi o que o próprio TCU instou o governo federal a fazer, por meio do Acórdão nº 2.328/2015-Plenário, relator Ministro Augusto Sherman, recomendando reavaliar a conta vinculada, sob a diretriz de racionalização de controles do art. 14 do Decreto-lei nº 200/1967: o custo do controle não pode superar o risco.  O Ministro-Relator viu indícios de que o procedimento, em certos casos, poderia se afigurar oneroso, embora, de forma geral, ofereça ao gestor segurança no gerenciamento do contrato, caso a contratada não honre com suas obrigações trabalhistas.

Assim, o TCU sugeriu avaliar alternativas como, por exemplo, aquelas suscitadas no Acórdão 1214/13: controles mais rígidos na seleção do fornecedor e fiscalização mais racional. Na mesma linha, seguiu o Acórdão nº 3.030/2015-Plenário, relator Ministro Augusto Sherman. A sugestão fazia todo sentido, pois riscos e controles devem ser conciliados com custos de transação, a fim de fundamentar escolhas com melhor custo/benefício.

Mas o estudo sugerido pelo TCU acabou não acontecendo. Pelo menos, não se tem notícia dele. No Acórdão nº 599/2017-Plenário, relator Ministro Augusto Sherman, verificou-se que, em vez da análise, criou-se alternativa à conta vinculada, o “fato gerador”, mecanismo que prevê a quitação de verbas provisionadas apenas quando de sua efetiva ocorrência, a exemplo de rescisão, ausências legais, bem como o auxílio maternidade e paternidade.

Veja-se que outro controle foi criado, sem demonstração de que tenha levado em conta os riscos e os custos. Tanto a conta vinculada como o fato gerador exigem detalhamento preciso, rígido e permanente de todos os empregados terceirizados que atuam no contrato, de forma a gerenciar, individualmente, verbas e direitos, relacionadas com os períodos em que estiveram atuando em dedicação exclusiva nas atividades contratadas.

Também não se tem notícia de que foi levado em conta outro ponto, abordado pela CGU em 2015[1], quando foram identificados números que apontavam para o superdimensionamento financeiro da conta vinculada, em relação à probabilidade de eventos motivadores de movimentação dos recursos. Continuou-se fazendo a mesma coisa, aparentemente sem reflexão apropriada.

Estudo recente, avaliando a conta vinculada num órgão do Judiciário, onde também é obrigatória, concluiu que a implantação ocorreu, novamente, sem avaliação prévia de custos e benefícios (MENDES, 2020). A pesquisadora concluiu que o controle indiscriminado soa como um julgamento de que todas as empresas contratadas estão predispostas a descumprir obrigações trabalhistas. Ela sugeriu que houvesse alguma liberdade de escolha para o gestor, a depender dos

riscos envolvidos. Concordamos com ela, em especial por causa dos números que apresentamos aqui e que poderiam ajudar o gestor a decidir.

Em sua pesquisa, Lorena Mendes (2020) verificou que a maior parte do dinheiro fica parada na conta vinculada, submetida a taxas de remuneração baixíssimas, que sequer mantêm o valor nominal da moeda, servindo, na verdade, como boa fonte de recursos para o banco depositário. Em muitos casos, a conta vinculada se torna uma forma de poupança forçada para as empresas, a ser resgatada no encerramento do contrato.

As rotinas de conferência da documentação nas solicitações de movimentação da conta exigem enorme esforço administrativo do contratante e oneram, também, a empresa contratada. Operar a conta vinculada compromete a fiscalização do objeto contratado. Nas palavras de um entrevistado, “é preciso praticamente paralisar os serviços da Secretaria para realizar em tempo hábil a conferência de um pedido que abarque mais de 200 terceirizados e que conta com uma dinamicidade natural abrangendo as mais variadas ocorrências” (MENDES, 2020, p. 97).

Lorena Mendes (2020) ponderou, de forma muito lúcida, que a adoção irrefletida da conta vinculada desconsidera os controles adotados na fase de seleção do fornecedor e mais tarde reforçados na execução contratual, pela exigência de o contratado manter as condições de habilitação e qualificação. Além disso, desconsideram-se os efeitos da Reforma Trabalhista, instituída pela Lei nº 13.467/2017, cuja tendência é de reduzir processos judiciais, pela inclusão de honorários advocatícios para a parte perdedora. Números recentes apontam para queda de 32% nos processos em primeira instância, dois anos depois da Reforma[1].

Ademais, existe ainda a influência da consolidação na jurisprudência sobre responsabilidade subsidiária, que pode alterar a probabilidade e os impactos dos riscos de inadimplência dos contratados.  

Guilherme Mazzoleni (2017) apurou 21% de decisões favoráveis à Administração Pública no TST, analisando 100 processos, antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 760.931, de repercussão geral, no STF. No mesmo estudo, o pesquisador identificou 99,3% de condenações no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Para o autor, os números apontavam para uma visão distorcida da realidade, um padrão decisório da Justiça Trabalhista, adotando fundamentos genéricos para justificar a culpa in vigilando nos casos concretos, sem demonstração efetiva da culpa, pelo simples fato de restar evidenciado o inadimplemento de verbas trabalhistas.

Partindo desses números, João Bastos (2018) analisou 72 acórdãos do TST julgados depois do RE nº 760.931. A proporção favorável à Administração Pública alcançou 71%, confirmando tendência de mudança nas decisões da Justiça Trabalhista. O tema, entretanto, ainda está longe de ser pacificado. Notícia recente revelou opinião do Supremo no sentido de haver resistência do TST em aplicar o entendimento do STF[2].

De qualquer forma, desde que a conta vinculada foi implantada e se tornou obrigatória, o cenário de riscos se alterou profundamente, seja pela Reforma Trabalhista, seja pela jurisprudência do STF, seja, sobretudo, pelos efeitos do Acórdão 1214/13. E isso merece, mais ainda do que merecia antes, estudo de custos e benefícios para avaliar a pertinência de sua adoção. 

Pautados pelo espírito da racionalidade administrativa, exortamos gestores, controladores, doutrinadores e fornecedores a refletir sobre a possibilidade de alterações nas normas, com objetivo de inserir, por exemplo, referenciais de níveis de riscos para a tomada de decisão sobre a adoção ou não de mecanismos onerosos como a conta vinculada ou o fato gerador, que tendem a desvirtuar o conceito de terceirização.

Em alternativa aos controles caros de retenção de pagamentos ou ressarcimentos para toda e qualquer verba provisionada, de todo e qualquer trabalhador, de toda e qualquer empresa, é possível imaginar cenário em que, primeiro, desenha-se um planejamento adequado da solução, com consulta apropriada das condições de mercado e da modelagem mais vantajosa, em especial em termos de agregação, integração e centralização de demandas, assim como de prazos contratuais, de início e de eventuais prorrogações. Assim, reduzimos os riscos de soluções ineficientes e aumentamos o patamar de exigências na seleção do fornecedor, sem perder de vista a manutenção de níveis razoáveis de competitividade, atraindo empresas especializadas e mais capacitadas.  

 

Depois, desenha-se um procedimento licitatório baseado em critérios robustos de seleção do fornecedor, conforme o objeto[1], com bons mecanismos de prevenção de fraudes, de preferência automatizados, como já existem, reduzindo fortemente os riscos de contratar aventureiros.

Selecionado o parceiro, avaliam-se os riscos inerentes a esse fornecedor, com base em seu histórico de ocorrências no Sicaf e na longevidade de seus contratos anteriores. Somente então, tomam-se decisões sobre os melhores e mais apropriados mecanismos de controle na execução contratual, proporcionais aos riscos, custos e benefícios do caso concreto. E se ajustam esses controles ao longo da execução contratual, conforme novas análises de risco.

Como uma boa gestão de riscos deve ocorrer.

Do jeito que é hoje, ignoramos os riscos, os custos e boa parte dos benefícios. Só nos concentramos em implantar os controles que parecem melhores, sem, de fato, terem sua eficácia, eficiência e efetividade comprovados.

Estamos diante de números que podem ajudar a mudar essa realidade.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BASTOS, João Rafael Gabbi. Responsabilidade subsidiária da Administração Pública após a decisão do RE 760.931. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Direito). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2018.

FREITAS, Marcelo de. Investigação das causas dos problemas de gestão e execução dos contratos de prestação de serviços contínuos, licitados por pregão eletrônico, pela Diretoria de Administração do Campus - Dirac/Fiocruz. Dissertação (Mestrado em Saúde Pública). Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2011.

MAZZOLENI, Guilherme. Responsabilidade subsidiária da administração pública na terceirização de serviços: Por que a exceção virou a regra? Monografia (Especialização em Direito). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017

MENDES, Lorena Lopes Freire. Terceirização de serviços na Administração Pública: uma análise da conta vinculada no âmbito do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Dissertação (Mestrado em Administração Pública). Fundação João Pinheiro, Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho, 2020

SOUZA, Kleberson Roberto de. SANTOS, Franklin Brasil. Como combater o desperdício no setor público: gestão de riscos na prática. Belo Horizonte: Fórum, 2019

SAIGG, Ibrahim Gonçalves. Terceirização de mão-de-obra na Câmara dos Deputados: elementos quantitativos e financeiros dos contratos. Monografia (Especialização em Orçamento Público). Instituto Serzedello Corrêa, do Tribunal de Contas da União, Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento (Cefor), da Câmara dos Deputados, e Universidade do Legislativo Brasileiro (Unilegis), do Senado Federal, Curso de Especialização em Orçamento Público, 2008.

CGU, Controladoria-Geral da União. Relatório de avaliação por área de gestão nº 3. Gastos do Governo Federal com terceirização de serviços de vigilância, limpeza e conservação predial. Brasília, abril/2015.


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